sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Poema O ANIVERSÁRIO DE JEKYLL

(Vejo-me patinando, durante a maior parte do ano, sobre o lago do Grande Urso, no Canadá)

Dr. Jekyll and Mr. Hyde / Fonte: Google Imagens.

Furioso, cáustico Mr. Hyde
Tormenta que atormenta meus ternos sonhos
Força má atrelada a mim e que não despenca de mim
Apesar dessa cara permanentemente rubra,
sintoma constante da tua irreversível cólera,
esta data não transitará desapercebida na tua memória
Mesmo sendo ela assim, sempre tão aturdida
Então, não se faça de demente, meu nocivo irmão
Dê-me um instante de trégua, não tente me matar agora
Atente ao que vai acontecer.

Hoje é o nosso aniversário
É fantástico!!! Inenarrável !
Consegui atravessar ileso a ponte
de longos anos de comprimento
que separa o dia de hoje dos gritos lancinantes
da minha sobrenatural genitora
Idolatrada, linda, mãe, mergulhada
na dor ímpar do parto
No momento em que eu saltava pra vida
No momento em que você me tomou
nessas enormes garras ferinas
Eu, aquela minúscula figura letárgica... suspensa
Nós, xifópagos num dualismo selvagem.

Mas agora, e daqui por diante, no âmago do útero
desta madrugada espetacularmente viva... orgânica
Possuído plenamente pelas suas altíssimas vibrações
Embarcarei diligente na certeza concreta
de nunca mais te enxergar
De não mais suportar, e suplantar, a submissão
às tuas monstruosas vontades
De escrever a princeps da minha vida
Nadar, dançar, gozar, voar, viver
Desejar a mim e aos meus amores maravilhosos céus de condor.

E para esta ocasião tão celeste, preparei este imenso bolo
Que hoje é negro simplesmente por ser de chocolate,
e não mais por simbolizar a estagnação do meu sangue
E sabendo muito bem que o que me dá prazer
te faz padecer, oferto a ti uma fração do meu êxtase,
para ferir teu débil paladar
Experimente-me agora! Sinta o gosto e seja envenenado!
Seja morto e exterminado!
Que esta cena vou tatuar nos meus olhos
Como se estivesse num quadro solar, nu, ajoelhado sobre o cetim azul
Espalhando pétalas brancas sobre o corpo, nu, da minha consagrada,
minha leoa doida adormecida.

Sobre meus loucos painéis não serão pintadas em afresco
as criações do horror, nem armados mil dioramas de morte ao amor
E jamais edificado um muro de Berlim
entre mim e o destino de ser feliz
Pois o rufar do meu coração anuncia que ainda sou
eternamente jovem
Sinto, exatamente neste milésimo de segundo
que já se foi há milésimos de segundo, e agora bem mais ainda,
que essa perversa maldição está sendo extirpada das minhas entranhas
Como uma lenta contagem regressiva até a explosão,
e o foguete subir dando violentas estocadas,
penetrando entre os grandes lábios do espaço si-de-ral
Feito um velho, bem velho, e suas muletas,
descendo perigosamente uma extensa e íngreme escadaria.

Para, de uma vez por todas, o pobre Jekyll transpor os pântanos
E se lançar, e se abrir ao estonteante inferno gótico
Escancarando os poros à erupção vulcânica dos seus psicodélicos demônios.

(Fábio Torres).

Dr. Jekyll and Mr. Hyde / Fonte: Google Imagens.


Nenhum comentário:

Postar um comentário